quinta-feira, março 10, 2005

Não há esperança (postado originalmente em 25/09/04, às 13:49).

Na parte da desesperança, felizmente não penso mais dessa forma. De resto, vale tudo.

Não há esperança. Isso eu asseguro prontamente quando olho para mim. Muitos podem considerar essa afirmação um exagero, mas é exatamente assim que eu me sinto. Já não lembro mais a última vez que me senti em paz. Os dias são difíceis, sinto que fico cada vez mais na escuridão. Minha cabeça dói. Meus olhos ardem e ficam pesados constantemente. Durmo mau quase sempre. Tenho um sono agitado; se não acordo várias vezes durante a noite, a minha cabeça e os meus pensamentos fazem questão de acabar comigo. Às vezes tenho sonhos que de tão agradáveis apenas pioram a situação quando acordo, já que eu tenho certeza que eles jamais se tornarão realidade. Tudo aquilo que desejo desmorona como se fosse sustentado por alicerces de areia em meio a uma tempestade, tamanha a facilidade que acabam e somem fugazmente. Eles refletem tudo o que eu sinto durante o dia: inúmeros sentimentos cuja força motriz é a desesperança total. É uma espécie de espelho desfocado e opaco, que mistura minhas ânsias, desejos e aflições. Gostaria de ajudar aqueles que amo de várias maneiras, mas como fazer isso se eu também preciso de ajuda? Levanto exausto todos os dias, fisicamente, psicologicamente e sentimentalmente. Há quanto tempo apenas não fecho os olhos e simplesmente sorrio, apenas por sorrir. Tento lembrar coisas, figuras, qualquer imagem ou contexto que me transporte à época em que era feliz e não me pegava chorando durante a madrugada, enquanto dirigia ou simplesmente sentado na sala da minha casa. E tudo sempre sozinho. Não existe algo pior do que você falar que está bem quando na realidade está péssimo. E eu já perdi a conta de quantas vezes já fiz isso. Vivemos em uma sociedade de consumo. Incitam você a materializar suas alegrias e sentimentos em produtos para não pensar. Sua felicidade é medida pela merda do código de barras. Lá está o preço da sua felicidade. Lançam produtos escrotos, porcarias tecnológicas, comidas práticas que só faltam chegar digeridas para irem direto ao seu estômago, tudo para evitar a demora. É a praticidade a serviço da boçalidade. Querem que você seja sucinto e superficial, usar a cabeça pode causar problemas. Seja arguto para discernir apenas a quantia que retirará do seu bolso. Consuma e não pense nada mais além disso. Se entupa de produtos das multinacionais que sufocam cada vez mais o nosso país e que acabam com o mundo nessa maravilhosa globalização tecnocrata de merda, que engorda cada vez mais os porcos capitalistas de sempre e apenas troca o contexto de miséria dos países do Terceiro Mundo, já que passamos a fazer parte da bosta da "integração mercadológica global". Ridículo. Incitam o individualismo. Eu, eu, eu. Pense em você e não no outro, queira sempre a porra do melhor carro, a merda da residência mais cara e luxuosa, a bosta do computador de última geração. Busque isso, mesmo que precise pisar nos outros. Aliás, nos incitam a alcançar tudo isso fazendo sempre o mal. Mecanize as relações humanas. Veja cada menos as pessoas e se apegue aos seus bens. Eu posso negar e você também, mas quando nós passamos pela rua e vemos um mendigo na rua e não nos importamos, isso é o reflexo do meio em que vivemos, por mais que tentemos ficar longe desse sistema que paradoxalmente está intrínseco a nós. E depois, quando percebo que eu fiz isso, como me sinto um pária. Há muito tempo eu não estou bem. Eu não estou bem. Posso falar sem problemas, o quanto tempo quiser, sobre qualquer assunto que envolva os piores sentimentos humanos: ganância, morte, destruição, indiferença... Mas quando é para dizer alguma palavra de afeto ou sentimento, como é difícil expressá-los. Até que ponto você agüenta a tristeza? Quanto suporta uma decepção? Consegue ser sempre indiferente à tanta podridão e canalhice à sua volta? O sarcasmo é válido, mas não 24 horas por dia. Estou cansado de ser sarcástico. Estou cansado de não poder me sentir ao menos um derrotado porque não me dão a oportunidade de tentar. Estou cansado dos meus olhos nunca enxergarem aquilo que procuro e desejo. Estou cansado de esconder minhas dores e não conseguir falar sobre elas. E acima de tudo, estou cansado de sentir. Estou cansado, muito cansado. E não sei quando isso vai mudar. Aliás, eu não sei de droga nenhuma.